E’ noite ainda e esperto já no quarto
Estou. Quero dormir e não consigo
A’ idéa de caçar, como se farto
Estivesse do somno, que eu bemdigo.
Olho ás horas... São trez menos um quarto.
... Agora, sim... Espera-me um amigo...
Ponho a espingarda a tiracollo e parto
A’ semelhança de um monteiro antigo.
Aos primeiros clarões da madrugada,
Emmaranhados em virente enxara
Estamos, quaes bandidos de emboscada.
Os passaros accordam numa festa
E, ouvindo-os, nem um tiro se dispara
Contra a alma sonorosa da floresta.
II
Porque malvado ser tirando a vida
Dos meigos passarinhos, cujo canto
Para quem traz a alma dolorida
Tem a virtude de um remedio santo?
Porque fazer calar essa sentida
Musica suave que recreia tanto
E, num transporte, leva á indefinida
Região azul mirifica do encanto?
Alguem, acaso, dulcido recreio
Julga o matar alacres passarinhos
Perversamente lhe varando ao meio
O pequenino coração? Talvez.
Ha muitas almas brancas como arminhos,
Ha muitas almas negras como pez!
Arco iris (1923), Diario da Tarde (09/07/1910)
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